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Literatura de Cordel
Autor: Francisco Diniz
João Pessoa-PB, 06.11.2011 – 15.11.2011
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Quando Deus criou o mundo
Não disse que aqui na Terra
As matas, os oceanos,
Vales, montes, qualquer serra,
Campos, colinas ou rios
Seriam pra fazer guerra.
Não foi pra criar discórdia,
Os planos da criação.
O ser humano devia
Agir após reflexão
E compreender o sentido
Do seu passar neste chão.
Que é buscar ser feliz,
Vivendo em comunidade,
Pois ninguém gosta da vida,
Se não em sociedade,
Mas por que tantos conflitos
No campo ou na cidade?
Por que o homem consente
Que o outro viva a sofrer?
Por que 2 bilhões de seres
Deixam 5 padecer?
Qual a graça de sorrir,
Se causar entristecer.
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Será a busca do prazer
Que se quer a todo instante?
Será a busca do poder,
– Que torna o ser confiante –
As causas do sofrimento,
Cada dia mais constante?
Se alguém padece é preciso
Saber quem é o culpado,
Mais que isso é necessário
Punir quem está errado,
Pois se há impunidade,
Tudo está equivocado.
Não adianta ter leis
Se a justiça não atua
Ou ter leis brandas e falhas
Tal doido no meio da rua
Arriscado ao atropelo
Vivo, no mundo da lua,
Tal se sente o homem pobre,
Que vive sempre a sofrer,
Vítima da injustiça
E de quem tem o poder,
Mas não o exerce direito
Como teria que ser.
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Pra que Constituição,
Que prega a igualdade,
Se milhões de miseráveis,
Órfãos da prosperidade
Padecem no esquecimento
Sem a menor dignidade?
Se falta à gente pobre
A digna condição,
É vital que esta mesma
Planeje alguma ação
Para adquirir o sustento
E a valorização.
É preciso, por exemplo,
Melhor se organizar
Em grupo, associações,
É preciso estudar,
E muito especialmente,
Saber em quem vai votar.
Ah se a gente soubesse
Escolher bem os gestores,
Desprezasse o corrupto
Na pele de alguns doutores,
Se a gente valorizasse
O papel dos professores.
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Talvez mais não se veria
No campo, a todo o momento,
A luta de quem precisa
Conviver com o desalento,
Pois não era mais preciso
A vida em assentamento.
Se houvesse governo justo,
Reforma agrária havia
E o conflito armado
Certamente inexistia,
Que só fere o mais fraco
Devido à tirania...
De fazendeiros, com apoio
De diversos governantes
E de parte da justiça,
Que se faz bem atuante
Quando o interesse é do rico,
Atendido num instante.
Mas em defesa do homem
Simples e trabalhador
A justiça se faz cega,
É surdo o governador
E vira mudo, ligeiro,
Quem se faz legislador.
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Diante de tanto caos,
Com quem pode, então, contar
O ser que busca no campo
Uma terra pra plantar?
É isto que nestes versos
Aqui viemos mostrar.
Este cordel vem tratar
Um pouco do Assentamento,
Que é Zumbi dos Palmares,
E hoje, neste momento
Narramos a sua história,
Conquista e sofrimento.
No Estado da Paraíba,
Na cidade de Mari,
Trabalhadores se unem,
Começam a discutir
Sobre a possibilidade
D’outra vida construir.
Reunidos duas vezes
No Salão Paroquial,
Cujo nome, Chico Mendes,
O líder do seringal,
Que morreu por defender,
Igualdade social.
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No período de 2 meses
Houve o trabalho de base,
O ano é 2001
E no final deste, ou quase,
Trabalhadores decidem
Partir para outra fase,
Do plano da assembléia,
Discutido no Salão
Paroquial de Mari,
Assim começa a ação,
Era 4 de dezembro,
Naquela ocasião.
17, as famílias,
Decidiram adentrar
A Fazenda Cafundó
Pra também participar
Da chamada Agricultura,
De fato, Familiar.
Fizeram acampamento
Sem medo, com muita fé;
Desarmados, sonhadores,
Homem, menino, mulher,
Protegem-se sob lonas,
Sob barraco qualquer.
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Da terra pra trabalhar,
Todos queriam um pedaço
E assim plantam, cultivam,
Enfrentam todo o mormaço,
Pois o nordestino é forte
E tem os nervos de aço.
Plantaram 10 hectares
De feijão, veja você,
Mas em 10 de fevereiro,
Já bem perto de colher
Veio a ação de despejo,
A primeira a acontecer.
Naquele 2002,
2 dias após a ação
De despejo aqui citada,
Tamanha judiação,
Por ordem do fazendeiro
Cortaram todo o feijão.
Porém após 8 dias
Toda a gente retornou
À fazenda pra lutar,
E o lugar que acampou
Foi no pé de uma mangueira,
O sonho continuou.
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Só que em março desse ano
O povo foi despejado,
E pela segunda vez,
Sentiu-se hostilizado.
A corda sempre arrebenta
É no mais fraco do lado.
Sem ter para onde ir,
Ficou toda aquela gente,
O jeito foi se abrigar
Por 1 mês no Tiradentes,
Assentamento vizinho,
E a luta segue em frente.
Pois em maio, com mais força,
Todos os trabalhadores
Para a sede da fazenda
Voltaram, e sem temores,
Acamparam e seguiram
Enfrentando dissabores.
Chega, então, o mês de outubro
E o Zumbi dos Palmares
Ganha a Primeira Imissão
De Posse, são novos ares,
Mas o fazendeiro é rico,
Forte junto a seus pares.
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E na 2ª Estância
Agrária ele investiu,
Vence a 1ª Imissão
De Posse e conseguiu
Suplantar a luta de um povo
Esquecido do Brasil,
Que por não se retirar,
Sofre em 3 de janeiro
Do ano 2003
Agressão de pistoleiro,
Que invade o acampamento,
Era grande o desespero.
Eram mais ou menos 20
Jagunços na ocasião,
Que chegaram em 2 carros,
Muitos de tocha nas mãos,
Vieram de todo lado,
Foi grande a devastação.
Queimaram 13 barracos,
Roupas, som, carro, TV
E deram uns 15 tiros,
A missão era fazer
O povo se intimidar,
Sair dali e correr.
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Apesar das ameaças,
Na terra o povo ficou
E no ano 2004,
Em novembro conquistou
Sua 2ª Imissão
De Posse, e se alegrou!
No ano 2005,
Pra conquista celebrar,
Dia 7 de setembro
Teve festa pra dançar,
Mas antes houve um torneio
De futebol do lugar.
Ainda em 2005
Veio o Primeiro Fomento,
Que é uma ajuda do governo,
Para comprar alimento,
Comprou-se uma vaca de leite
Pra melhorar o sustento...
Foram comprados também
Um belo boi de carroça,
Um monte de ferramentas
Para o trabalho na roça,
De uso em todo o serviço,
Até pra construir fossa.
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No ano 2006
Começou a construção
De casas de alvenaria
Para a população,
Aí veio a luz elétrica
Pra alumiar todo o chão!
Programa “Luz para Todos”
Trouxe grande alegria,
Houve comemoração
No Zumbi naquele dia,
Vieram até políticos,
Vejam só, mas quem diria...
Lideranças de Mari,
Luiz Couto, o deputado,
Um dos poucos que merece
Ser eleito no Estado.
A Ministra de Energia
Festejou aqui um bocado.
No ano 2008
Veio o Segundo Fomento,
Melhorou um pouco mais
A vida no Assentamento,
Foi feito até cacimbão,
Importante investimento.
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Depois foram construídas
Cisternas e a escola.
Surgiram outros projetos
Assim o Zumbi decola,
Trabalhando com esperança,
Tendo o sonho por bitola.
Como o sonho não se mede,
O povo segue escrevendo
A sua própria história,
Prova que vai dependendo
Do seu agir e esforço,
Pois isso estamos vendo...
Na ação do Grupo Jovem,
Com a Cooperativa,
Com o Grupo de Mulheres,
Cuja iniciativa
Tem sempre o objetivo:
Melhoria coletiva.
Há uma equipe técnica
De assistência ao assentado,
Há o Projeto Mandala,
Que tem muito estimulado
A plantação de hortaliças
E frutas por todo lado.
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A EMBRAPA tem ajudado
No projeto do algodão,
Há criação de galinha,
De carneiro e há ação
Pra construir a capela
Dedicada à oração.
Em toda a comunidade
É grande o envolvimento
Para reformar as casas
Do início do Assentamento,
Pois depois de 5 anos
Pedem por melhoramentos.
85 famílias
Hoje estão assentadas,
Convivem em 8 grupos,
São pessoas dedicadas,
Que pregam a harmonia,
São de fato irmanadas...
Nos projetos mais diversos,
Como o da padaria,
Que ensinou uma profissão
E trazia alegria
Ao dar para o povo o pão
Sagrado de cada dia.
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A prova do crescimento
Do Assentamento está
Na quantidade de gente
Que lá vive a morar
Desde o filho do assentado
Que decidiu se casar.
Mas tal como no Quilombo
De Alagoas de outrora,
Este Zumbi dos Palmares
Aceita, e sem demora,
Quem precisa de ajuda,
Como lá existe agora...
16 novas famílias,
Que em barracos cobertos
Por lona, vivem abrigadas
E desejando, por certo,
O oásis da esperança
Para enfrentar o deserto...
Trata-se do Acampamento,
Que fora então batizado
Assim: Pequena Vanessa,
Este nome fora dado
Em homenagem à menina
Que morreu lá no Estado:
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Rondônia em 95,
Corumbiara, a cidade
8 de agosto, o dia
Da imensa crueldade,
Sofreu um tiro nas costas,
Acordou na eternidade.
Vanessa foi outra vítima
De ódio, perseguição,
Na Fazenda Santa Elina,
Naquela ocasião,
Mas deixou pra todos nós
Muito mais que uma lição...
Que os seres humanos são
Contraditórios demais:
Uns desejam quase tudo
Sem saber que isso faz
Desencadear a guerra
E depois falam em paz;
Que é muito importante
A ação de resistir,
Mesmo que a farta colheita
Aconteça num porvir
Por outros se não tivermos
Mais vivendo por aqui.
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Resistência é a tônica
Do que aqui foi retratado
No Assentamento Zumbi
Dos Palmares, neste Estado,
Em Mari e é preciso
Que isto seja divulgado.
Desde a lida das mulheres
Na roça de macaxeira,
Lá na Casa de Farinha
Para fazer de primeira
Os bolos que são vendidos
Na escola ou na feira;
Da ação dos professores,
Na sala, no sol a pino,
Tal Francisco Alberione,
Dos alunos: Severino,
Carlos, Fabrícia, Edneide,
Joelma, negro ou albino.
O trabalho é de todos
Que estão na Cooperativa
Do presidente Raimundo,
De tantos, que na ativa,
Dão sua contribuição
Pra que esteja sempre viva...
A memória deste povo,
Merecedor de respeito,
Como a de Lucinaldo,
Que cheio de orgulho o peito,
Comentou o que escrevi,
Só não sei se fiz direito.
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Fim
Francisco Diniz
João Pessoa-PB, 15.11.2011, 15h e 22 min.
83 8862-8587