segunda-feira, 7 de maio de 2012

Cordel de Dideus Sales




O MUNDO CORDELIANO 
DE RODOLFO COELHO CAVALCANTE
Dideus Sales

O mundo cordeliano
Encontra-se exultante,
Degustando este momento 
Glorioso e cintilante,
De entusiasmo e colheita,
Fruto da plantação feita
Por Rodolfo Cavalcante.


Arrojado e desenvolto,
Rodolfo, um alagoano
Da pequena Rio Largo,
Peregrinou qual cigano,
Foi camelô e humorista,
Tornando-se o cordelista
De luz do solo baiano.

Foi em mil e novecentos
E dezenove que veio
Ao mundo para brilhar
E ser da arte um esteio,
Magnífico menestrel
Que deu impulso ao cordel
Além do tempo em seu meio.


Nascera num ambiente
De muita simplicidade,
Seus pais, Arthur e Maria
Passaram necessidade,
Mas não pouparam conselho
Pra que Rodolfo Coelho
Fosse um homem de verdade.


Com treze anos apenas, 
Garoto de alma pura,
Jogou-se à mercê da sorte
Em inédita aventura,
Palmilhando o sertão quente
Até achar a nascente
Da sua literatura.


A infância foi insípida,
Precária a adolescência,
Precisando trabalhar,
Pois, lhe faltava assistência...
Assim levou seu fadário,
Garimpando o necessário
À sua sobrevivência.


Da região nordestina
Sob o sol abrasador,
Percorreu os nove estados
O errante trovador,
Bordando sonhos e frases
Até compor seu oásis
Na bonita Salvador.


Pousou em quarenta e cinco
Na capital da Bahia,
Fez encontros de poetas
De folheto e cantoria,
Com seu carisma e fluência
Provocou efervescência
No mundo da poesia.


Com arte e muita elegância
Plasmou o seu universo
Poético sem aos colegas
Tornar-se alheio ou disperso,
Por todos tinha desvelo,
Imprimindo este modelo,
Fez-se um poeta diverso.


Sua verve não brilhou
Apenas no cordelismo,
Muito vivaz e arguto
Mergulhou no jornalismo.
Sempre habilidoso e ético,
Editou “Brasil Poético”,
Jornal do trovadorismo.


Fez “A Voz do Trovador”
Juntando o povo que pensa,
Para dar vez aos poetas,
E à trova dar voz imensa;
Com o jornal consolidado,
Ajuda a fundar no estado,
A Associação de Imprensa.


Seu perfil foi adornado
Desde o albor da infância,
Com os diamantes da ética
E os lírios da elegância,
Ornamentou sua estrada,
Deixando cristalizada
Criação de relevância.


Rodolfo com a escrita,
Costurou eterno enlace,
Tecendo verso e criando
Entidades para classe.
Poeta vário e fecundo
Que construiu o seu mundo
E a cada dia renasce.


Com boniteza poética
Soube imprimir seu matiz
Em estrofes bem traçadas
Que não constam em release,
Mas quem as sabe de cor
Diz que fora o maior
Cordelista do país.


Em sua vastíssima obra
Vemos um matelassê
De tantos títulos e temas
E até indago: por que
Naquele tempo, poeta
Como ele, um esteta,
Fazia tanto ABC?


Foi da sua grande lavra
O principal editor,
Todos seus folhetos têm
De poesia sabor:
“ABC dos namorados”
E outros ABC falados:
Da “macumba” e “do amor”.


Por tudo que produziu,
Pra ele tiro o chapéu;
“O Drama do Comandante”
Merece aplauso e troféu
Junto com “Príncipe Formoso”
Um romance primoroso,
E o bom “Lampião no Céu”.


Em veículos de cultura
Soube fazer a manobra;
A métrica de seus cordéis
Não constitui falta ou sobra.
Imensuráveis capítulos...
Mil e setecentos títulos
Fazem sua bela obra.


Substantiva e robusta,
Sua obra não colide
Com os clássicos, aliás,
É buquê que coincide
Com os que estão nos jarros
De Leandro G de Barros
E João Martins de Athayde.


A ele hoje comparo
Pela consciência clara,
Gonçalo Ferreira Silva,
Um gênio que se declara
Fã do poeta de escol,
O brilhante Rouxinol
E Moreira de Acopiara.


Existem, no mesmo nível
Outros, fazendo justiça,
Cito alguns para ilustrar,
Pois, poesia castiça
Natural e espontânea,
Burilada e instantânea
É no Nordeste que viça.


Cordelista de alto nível,
Aplaudido e renomado,
Tendo em vida muitas glórias,
Deixou-nos grande legado.
Pra que seu nome se zele,
Até pela ABL 
Ele foi condecorado.


Eno Theodoro Wanke 
E Matine Kunz teceram
A trajetória do bardo
Em obras que escreveram,
Livro muito abalizado
E tese de doutorado
Que até pós- doutores, leram.


Expoente do cordel,
Figura branda e modesta,
Incentivador dos jovens,
Aparador de aresta.
Irradiava alegria,
Declamando poesia
Rodolfo fazia a festa!


Do seu estro luminoso
Brotou extraordinário
Trabalho que ainda é 
Atual e necessário,
Soube escrever o real
Como fora magistral
No terreno imaginário.


Um líder incontestável
Competente e carismático,
Escritor muito inventivo
De conhecimento prático
Na seara da poesia
Que se fez com maestria,
Do cordel um catedrático.


Virou artesão de sonhos
Muito cedo a desenhar
A poesia do povo
Cumprindo a sina invulgar
De divulgar a beleza,
Para manter sempre acesa
A cultura popular.


O soteropolitano
Cidadão emudeceu
No dia 7 de outubro,
Quando um veículo o colheu
Com o chofer alcoolizado,
Cruel e despreparado, 
Que sequer o socorreu.


Ao hospital Simões Filho,
Depois ao Getúlio Vargas,
Rodolfo fora levado
Com feridas muito largas
Devido à forte pancada, 
Naquela noite minguada
Teve as horas mais amargas.


Isso no século XX,
No ano de oitenta e seis,
Perdemos o cordelista
Da mais plena lucidez,
Cobrindo de empecilhos
A trindade órfã de filhos
E Hilda na viuvez.


Sem sequer dizer adeus,
Foi-se o nosso timoneiro,
Lavrador de lindos sonhos,
Da esperança, mensageiro,
Apóstolo da poesia
Que o Brasil reverencia
Por seu espírito altaneiro.



Fonte: http://mundocordel.blogspot.com.br